Sobre pesquisa e outras infâmias

Diário de campo de dois espectadores e um pródigo bucaneiro.

sexta-feira, janeiro 29, 2021

A educação que demos aos nossos filhos fracasou? (um texto bem antes da pandemia?

Farei entrada no reino das utopias sociológicas e com isto terei, antes de entrar neste curtíssimo passeio, que colocar no portal as palavras que o Dante escreve nas portas do inferno: “ Lasciate ogni speranza voi che’ entrate” (Vos que entrais, abandonai toda esperança).  

É conveniente não esquecer que a chamada humanidade ocidental por volta do s. XVI deu mostras da construção do único mito importante que o Ocidente deixará como legado à humanidade: O grande acordo fáustico. Para quem não lembra, o pacto fáustico está relacionado à completa mudança de atitude simbólica e comportamental a respeito da nossa relação com o mundo. Já não será possível “lavar os cavalos para grandeza de Deus” como faria São Francisco de Assis e sim “lavá-los por que estão sujos” como faria Don Quijote de La Mancha.


  Isto significa que a nossa bela alma imortal foi negociada em troca pela paixão por conhecimento, pelo poder aliado à sensualidade, pelo domínio sobre a phisys, isto é, sobre as forças que a natureza desencadeia, pelo acumulo de bens materiais, o culto a excelência do indivíduo “homem”, a apologia do progresso, a competição, o orgulho, a luxúria...

       

No jardim das delicias faustianas usufruímos da popularização de todas as bujingangas da industrialização. As mulheres acasalaram com os “traficantes de desejos” (o Bom Marchê) os “shoppings centers” onde podiam acariciar os tecidos de seda sem a intermediação dos caixeiros viajantes. E os homens plenos de fantasias podiam adquirir todo tipo de objetos que lhe assegurassem uma infância tranqüilizadora.


 Definitivamente esquecemos os ensinamentos de Epicuro e nunca mais ficamos felizes com aquilo que adquirimos. E eu que sempre tive aberração pelo mito cristão da proibição da árvore da vida e sua maçã... Hoje, meditativo, entendo que o Deus antigo do paraíso tinha razão. É muito difícil, se não impossível dizer... até aqui está bom...não quero mais, estou feliz com o que eu tenho ou conquistei.


O acordo fáustico nos deixou mais ricos e menos sábios, nos trouxe um eterno arrependimento sobre os excessos do Deus progresso, nos deixou ansiosos e vigilantes. Por que, a qualquer hora, o mundo pode se desmoronar nas mãos de quem tem o poder das armas. (na verdade a ameaça era no mundo microscópico, não sabemos ainda se foi uma arma criada)


O pacto fáustico nos tirou a ingenuidade, nos deu a máquina e nos trouxe o anonimato e a solidão das cidades. Superou a pintura Naif e nos deu o Picasso, matou o canto gregoriano e nos deu Wagner. Rivalizamos com as divindades autoritárias e patriarcais mais nosso coração endureceu e perdemos a capacidade de nos arrepender e perdoar.


A nossa relação com os “deuses” ficou desequilibrada... Em suma nos tornamos indivíduos auto-referenciados que tiramos o máximo da utilidade das nossas interações...


Sim, aprendemos a olhar para as pessoas como quem olha para canivetes suíços.


 E hoje já não podemos mais desenvolver as virtudes que só uma longa convivência permite realizar. O senso da lealdade, do comprometimento e o cultivo das convicções. Richard Sennett tem razão, estamos à deriva.


 Chega...


 E então, como é que vamos dizer que nossa educação fracassou?


Como é que podemos pensar que os objetivos da grande narrativa faustiana não foram cumpridos?


 Não é difícil enxergar esse individuo educado para adorar o Deus da tecnologia, o Deus do progresso, o Deus da bolsa de valores, da burocracia, do capital, dos objetos.

Convenhamos que a grande escola faustiana da evolução moderna triunfou sobre nossas almas e nossas instituições.


A minha filha me fez há tempos a pergunta basilar ... “Papai, por que eu tenho que estudar três horas de português, três horas de matemáticas e apenas uma hora de arte?”


Eu respondi... Minha querida filha, alguém quer que você vire uma burocrata e não sou exatamente eu... Mas no fundo fui eu sim quem planenejou  esse roteiro da educação faustiana (não esqueçamos que o Diabo gosta de papeis assinados como bem o mostrou Goethe no seu Fausto)


Dito isto, caro leitor, não há final feliz dentro das circunstâncias circulares e viciosas em que se discute qualquer tipo de reforma educativa.


Se compararmos nosso processo de educação com o processo de socialização de uma sociedade indígena observaremos o grau de artificialidade que o nosso caminho educativo possui. Foi Paul Gauguin que me ensinou a ter compaixão dos meninos taitianos que na flor do tesão da idade eram submetidos a aulas intermináveis enclausurados em salas de aula, assim como foram submetidos nossos indígenas nas missões católicas e assim como são submetidos os nossos jovens nas escolas do capitalismo pós-moderno.


 Os indígenas educam os filhos para serem adultos, nós educamos nossos filhos para passarem no vestibular.


Na escola, e isto já é conhecimento antigo, os alunos não apreendem física, ou química, ou português ou geografia. Nas nossas escolas os jovens aprendem a submeter sua sexualidade, aprendem a obedecer, aprendem a respeitar a hierarquia das instituições e apreendem a controlar a vida de outros seres humanos, encarcerados em galpões maquiados em quanto os pais provedores investem suas horas de vida em trabalhos burocrático-urbanos que os ajudam a pagar as contas e a pagar a vida nas metrópoles que incluem esses galpões que educam seus filhos.


 Então car@ leitor@ quando o aluno, não para quieto na carteira, quando rejeita a sala de aula, quando tira notas baixas nas matérias e se nega a ler os textos, quando não respeita o professor, quando mata aula, quando quer ficar “isolado” na sua comunidade virtual... A final, o que é que ele está falando?


 Ele está simplesmente dizendo “... por enquanto, eu não quero participar de esse mundo que vocês desenharam e que ninguém me consultou antes de ser materializado... Me deixa em paz um bocado antes de que meu desejo vire pô e a beleza do mundo vire cinza...”  


Abraços de coração a todos


 Eladio Oduber



terça-feira, novembro 07, 2017

Histórias inacreditáveis de alunos inverossímeis:


Hoje, madruguei disposto a finalizar de uma vez por todas o atribulado semestre corrigindo alguns trabalhos que me foram entregues com atraso. Dei uma “vista de olhos” por um texto que visivelmente não tinha sido escrito pelo (a) aluno (a)... (perdão, meus pré-julgamentos nestes casos as vezes funcionam).

O trabalho em questão não suportou duas ou três buscas no Google. Assim, começaram a aparecer como ratazanas os trechos plagiados de sites na internet.
Depois disto evitei “morder a carne do inimigo vencido”, porém, acho que não consegui segurar um sorriso que apareceu flutuante no rosto.

Mal sabia eu que a surpresa maior viria de um segundo trabalho, também plagiado da internet. Só que desta vez o fato me fez mergulhar num misto de perplexidade e estranha alegria. O (a) aluno (a) copiou um texto da minha autoria de uma revista on-line que coloca o nome dos seus colaboradores somente no final dos artigos.

O aluno não teve a paciência de ler o texto até o final. Só assim saberia que seu professor o tinha escrito. O professor da disciplina. O professor que avaliaria o trabalho final que ele estava digamos assim...construindo.

Moral da história. Não é suficiente ter o sangue frio para quebrar a ética acadêmica na hora de cometer o crime de plágio. O criminoso deve dar-se o trabalho de observar com mais acuidade, ter cautela e ler até o final o material a ser plagiado. “A pressa é inimiga da perfeição”, até nas baixas veredas intelectuais. (ou principalmente nelas...)

Depois a gente vê por aí filas de cidadãos “formados” querendo vender suas almas ao Diabo e nem um único Diabo que queira comprá-las... Pequenos mal-feitores atrapalhados e perseguidos pela própria angústia.

Acho que depois desta já tenho alguma coisa para contar neste mundo da Educação Superior Privada no Brasil.



Abraços do Eladio Oduber.

sexta-feira, março 25, 2016

Aforismos a propósito da leitura de "no caminho de swann" M. Proust

1. Nem sempre o abandono dos limites fez bem a arte. A ruptura com a "forma" fez dos artistas seres entediados, frouxos, sem disciplina. "Saciar a sede com água salgada" virou costume;

2. É dos tempos de Proust a frivolidade do jornalismo;

3. Já no s. XIX existia o verniz das escadas;

4. Nos nossos tempos o declínio da figura da "mãe" deve-sse à possibilidade de aproximação de muitas outras mulheres. Assim, essa limitação foi superada;

5. As vezes uma gota de vinho desce pela haste e grita LIBERDADE;

6. Fosse o tempo em que os presentes eram objetos preciosos, herdados;

7. A fotografia , no inicio, foi considerada "mecânica"  e "vulgar". A profundidade estilística da pintura pode ter provocado estas opiniões;

8. "Ter um interesse para além de se mesmo": eis aqui um motivo para ser artista...

9. A verdadeira arte tem muito de generosidade.

Boa noite a todos  Eladio Oduber

quarta-feira, fevereiro 25, 2015

LEITURAS PARA CONHECER O BRASIL: Proposta de evento. Por: Cinthia Oliveira e Eladio Oduber

I. VISÃO GERAL DO PROJETO

Em 30 de setembro do ano 2000, na edição 41 da revista Teoria e Debate foi publicado um artigo assinado pelo pensador brasileiro Antônio Cândido. O artigo respondia a um “desafio” que lhe fora feito: recomendar 10 livros que pudessem servir de “bússolas” para o entendimento da história social do Brasil.     
 A pesar de um inicial “contragosto” pelo limite do número de livros imposto, o mestre Antônio Cândido aceitou o desafio e recomendou quatorze livros para driblar o risco da simplificação como ele mesmo deu a entender no artigo.
Antônio Cândido organizou uma bibliografia, chamada por ele “básica”, atendendo aos seguintes critérios históricos ou sócio-políticos:

1.    Os europeus que fundaram o Brasil;
2.    Os povos que encontraram aqui;
3.    Os escravos importados sobre os quais recaiu o peso maior do trabalho;
4.    O tipo de sociedade que se organizou nos séculos de formação;
5.    A natureza da independência que nos separou da metrópole;
6.    O funcionamento do regime estabelecido pela independência; 
7.    O isolamento de muitas populações, geralmente mestiças;
8.    O funcionamento da oligarquia republicana;
9.    A natureza da burguesia que domina o país.

Desta forma elencou uma cronologia de quatorze livros que para o autor são apenas introdutórios no entendimento da construção sócio-histórica do Brasil.


1.     O povo brasileiro (1995), de Darcy Ribeiro;
2.     Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda;
3.    História dos índios do Brasil (1992), organizada por Manuela Carneiro da Cunha;
4.    O abolicionismo (1883), de Joaquim Nabuco;
5.    Ser escravo no Brasil (1982), Kátia de Queirós Mattoso;
6.     A escravidão africana no Brasil (1949), de Maurício Goulart ou A integração do negro na sociedade de classes (1964), de Florestan Fernandes;
7.     Casa grande e senzala (1933), de Gilberto Freyre;
8.    Formação do Brasil contemporâneo, Colônia (1942), de Caio Prado Júnior;
9.    D. João VI no Brasil (1909) e O movimento da Independência (1922) Oliveira Lima;
10.  A América Latina, Males de origem (1905), de Manuel Bonfim;
11. Do Império à República (1972), de Sérgio Buarque de Holanda;
12. Os sertões (1902), Euclides da Cunha;
13. Coronelismo, enxada e voto (1949), de Vitor Nunes Leal;
14. A revolução burguesa no Brasil (1974), Florestan Fernandes.

A proposta aqui apresentada sugere a realização de um evento colaborativo que consiste na leitura e conversação sobre a bibliografia apresentada pelo escritor Antônio Cândido. Tal evento pretende ser desenvolvido ao longo do ano 2015, organizado pela Antropóloga Msc. Chintia M. R. Oliveira (coordenadora do Departamento de Museologia Social do Instituto Brasileiro de Museos –IBRAM) e pelo professor Doutor Eladio A. Oduber, sociólogo (professor das cátedras de Sociologia e Pesquisa Aplicada no Centro Universitário Instituto de Educação de Brasília – IESB)

II. O EVENTO: ABORDAGEM, ESTILO E APRESENTAÇÃO:

Serão escolhidos apenas dez títulos dos sugeridos pelo autor a serem lidos durante o período que vai de março a dezembro de 2015.
Os encontros para resenha crítica e conversação sobre os textos serão realizados no auditório do IBRAM – Setor Bancário Norte Brasília- DF toda última quinta feira de cada mês.
No total, serão organizados dez encontros de aproximadamente duas horas e meia cada um. A média de páginas de cada livro sugerido é de 300 pp. O que poderá exigir uma leitura de dez páginas por dia para o participante que pretenda conhecer o material a ser discutido na sua totalidade.
Ao final de 2015 teremos feito aproximadamente vinte e três horas de conversação sobre a história social do Brasil. Isto sem contabilizar o tempo de leitura individual de cada texto que deve girar em torno de dez horas-livro por mês (20 minutos diários; dez páginas por dia, 600 minutos-mês, 10 horas-mês, aprox.)  


           
A discussão dos textos em cada encontro será organizada da seguinte forma:
            Haverá uma mesa formada por três convidados em que um deles será o resenhista do texto e os outros dois comentaristas da leitura.
            A exposição, que poderá ser uma resenha crítica, deverá ser realizada em vinte minutos. Seguidamente, os comentaristas da mesa terão cada um dez minutos para considerações. Depois destas três falas, que somam 40 minutos, será aberto o debate para os participantes que poderão ser inscritos, se necessário for. 
            O encontro pretende ser encerrado no Museu Nacional de Brasília no mês de dezembro de 2015 com uma exposição virtual ou física de objetos que, em parceria com vários museus do Brasil, possam ilustrar e complementar didaticamente as discussões desenvolvidas durante os encontros.
            A cada encontro o resenhista e comentaristas serão convidados a gravarem em meio áudio-visual uma síntese de quatro minutos sobre os aspectos mais marcantes da leitura e discussão para serem veiculados, sem edição e quase que em tempo real, nas redes sociais ou canais virtuais como Youtube.
             No final do evento poderá ser realizada uma confraternização com música instrumental organizada pelos próprios participantes em local a ser escolhido.

III. PARA OS POTENCIAS PARTICIPANTES:

O evento proposto está dirigido para estudantes, professores, pesquisadores e profissionais de qualquer área que possuam interesse em conversar sobre a temática proposta.
            A participação é completamente livre e não possui custo algum. Os potenciais participantes podem trazer convidados e eventualmente sugerir comentaristas e resenhistas para comporem as mesas de trabalho.
            Sendo o evento uma iniciativa totalmente voluntária por parte dos organizadores e participantes, em princípio não contará com a presença de acadêmicos, nomes reconhecidos ou especialistas renomados nas áreas a serem discutidas. Por tanto, as conversações podem ser consideradas encontros exploratórios e de familiarização com os temas tratados, organizado e conduzido apenas por amantes da leitura crítica sobre a formação social e histórica do Brasil.
           

IV.          INFORMAÇÃO BILIOGRÁFICA

A bibliografia recomendada pelo professor Antônio Cândido encontra-se em boa parte em quase todas as bibliotecas de Brasília, ou sebos virtuais ou da cidade. Também pode ser encontrada em sites da internet para download.
Poderá ser de grande utilidade a comunicação entre os interessados para troca de textos e digitalização ou cópia dos livros de difícil acesso.
O artigo completo sobre as justificativas das escolhas dos textos e outras considerações feitas pelo professor Antônio Cândido pode ser encontrado no seguinte endereço:
Alguns títulos originalmente recomendados pelo autor poderão ser substituídos dada a dificuldade da obtenção ou da pertinência do tema abordado.

V.           CRONOGRAMA DOS ENCONTROS (Preliminar, sujeito a modificações)

1º encontro: 26/03/2015 - O povo brasileiro (1995), de Darcy Ribeiro;
2º encontro: 30/04/2015 - Raízes do Brasil (1936), de Sérgio Buarque de Holanda;
3º encontro: 28/05/2015 - História dos índios do Brasil (1992), organizada por Manuela Carneiro da Cunha; (livro com dificuldades de ser encontrado, podendo ser substituído)
4º encontro: 25/06/2015 - O abolicionismo (1883), de Joaquim Nabuco
     5º encontro: 30/07/2015 - Os sertões (1902), Euclides da Cunha;
6º encontro: 27/08/2015 - Ser escravo no Brasil (1982), Kátia de Queirós Mattoso; ou A escravidão africana no Brasil (1949), de Maurício Goulart
7º encontro: 24/09/2015 - Casa grande e senzala (1933), de Gilberto Freyre;
8º encontro: 29/10/2015 - Formação do Brasil contemporâneo, Colônia (1942), de Caio Prado Júnior;
9º encontro: 26/11/2015 - A América Latina, Males de origem (1905), de Manuel Bonfim;
10º encontro e fechamento: 17/12/2015 – (Texto ainda não escolhido – provavelmente: Há mundo por vir?  – ensaio sobre os medos e os fins. Editora Cultura e Barbárie Eduardo Viveiros de Castro e Déborah Danowski).
O fechamento das “Leituras para conhecer o Brasil” será encerrado no Museu da República. Mudanças no cronograma ou na bibliografia sugerida serão comunicadas com antecedência.


Att. Cinthia M. R. Oliveira e Eladio A. Oduber P. 

quarta-feira, fevereiro 11, 2015

Os desejos incestuosos dos diretores de cinema

Orestes, filho de Agamenon e Clitemnestra, intera-se, na vida adulta, que seu pai foi assassinado num complot que a sua mãe e seu tio Egisto realizaram quando ele apenas era uma criança[1]. Quando Orestes atinge a maioridade vinga a morte do seu pai matando a Clitemnestra. Orestes fica então louco. Robinson Jeffers[2] cria em 1925 uma versão do monólogo do Orestes quando volta para Micenas depois de ter vagado pela floresta, “torturado de visões”. Estas palavras ele profere em resposta a Electra, sua irmã, que na ocasião propõe-lhe casamento:

Tive uma visão, nós nos movíamos nas sombras;
Tudo o que fizemos e sonhamos
Era recíproco; o homem perseguia a mulher,
a mulher agarrava-se ao homem; reis e guerreiros
combatiam-se na escuridão, todos amavam
ou lutavam interiormente, cada qual perdido,
buscava os olhos de alguém que o louva-se,
nunca os seus, sempre os alheios.
Voltando-se, viam apenas um homem de pé no começo, ou
Olhando para diante, outro no fim; ou para cima,
Homes no céu brilhante, correndo e banqueteando-se.
A estes chamam deuses...
E, no íntimo, mil desejos incestuosos...
(Robinson Jeffers apud MAY:1991 p. 109)

A história do Orestes como um ponto de partida nos permite imaginar que o olhar do diretor de um filme pode ser amplificado por dois dispositivos: O primeiro, a câmera, que transcende sua subjetividade, que tem “sede de realidade”, sede histérica de “verdades” e “ficções”. E o segundo. A tela; com “mil desejos incestuosos”, “procurando os olhos de alguém”. Nunca os seus, sempre os alheios. A tela é também o grande olho do diretor e não somente a câmera como normalmente se pensa. Entretanto, na projeção sobre a tela o olho do diretor está sempre à procura de outros olhos que deseja encontrar? Nem sempre.
No cinema, assim como em outras artes, o criador que toma a direção do que o “grande público” espera, estabelece uma comunicação “incestuosa” com seu receptor. Dificilmente “sangue e genes novos” entram nas veias da arte que é feita para agradar.
Entretanto, o grande olho da tela que se inclina na direção de outras subjetividades, que se apaixona “voltado para fora” isto é, o cinema que não é feito para a diversão do grande público, entende dolorosamente, como já dizia André Breton, que “o principal inimigo da arte é a vida”. Compreende que os membros do próprio clã hostilizam a criação por que temem a peregrinação do “amor” voltado para longe dos muros da aldeia. Robert Stam no seu livro “Introdução à teoria do cinema” lembra as palavras que em 1958 foram ditas pelo Godard: “estamos sempre sós”. Esta frase resume o preço pago pelo diretor cuja tela procura seus próprios olhos e não os alheios.
O cinema, afastado da relação “incestuosa” com seu público ganha profundidade estilística. Ausência ou presença de estilo diferencia um filme de outro. Entretanto, “estilo” não é uma categoria metafísica. Estilo significa síntese e mudança ao mesmo tempo. Sem estes dois elementos qualquer cinematografia ou qualquer arte torna-se ingênua... Ou melhor, torna-se inerte. E qual é o preço das mudanças estilísticas? Qual o preço de superar a imobilidade de estilo?      
            Muito provavelmente a solidão. Ou ficar com tão pequeno contingente de público que a produção não convença seus potenciais patrocinadores.
Então esconderá alguma verdade aquele pensamento - que faz parte do senso comum cinematográfico - de que o filme “vai ao encontro do seu público”?
Pensemos sobre profundidade estilística, ou sobre diretores, ou sobre filmes que decidem caminhar afastados do público.
O espectador. Aquele elemento imponderável que enche ou se ausenta das salas por motivos “quase” inexplicáveis e que provavelmente se identifica com o que está sendo projetado por que quer entender quem ele é antes de morrer, a semelhança do soldado agonizante no quadro do Filoxeno[3].

PS: Dedico este post aos meus admirados alunos de métodos no curso de cinema IESB- Brasília: Alanna Pinheiro Amorim, Sandro Villanova, Cássio Oliveira, Pezão, Teninson... eles ajudaram a objetivar estes pensamentos . Obrigado menina obrigado meninos. 

[1]História de conflito humano escrita por Esquilo na Grécia antiga.
[2] Poeta norte-americano (1887 – 1962)
[3] Refiro-me ao quadro do pintor grego Filoxeno de Erétria  (435 a C - 380 a C) onde foi eternizada a batalha de Issos em Pompeya.

domingo, novembro 09, 2014

Enquete feita pela Cámara sobre o conceito de família:


A forma como está elaborada a pergunta induz ao erro.
- Você concorda com a definição de família como núcleo formado a partir da união entre homem e mulher, prevista no projeto que cria o Estatuto da Família?
Sim
Não
Não tenho opinião formada
Se retirarmos a interrogação final fica a afirmação de que o entrevistado concorda com tal definição. Estudos feitos por instituições de pesquisa em diferentes épocas na Alemanha e na Inglaterra demonstraram que esta forma de perguntar enviesam os resultados das pesquisas.
Uma das formas corretas de perguntar sobre este tema seria assim:
- Escolha a opção que mais se aproxima da definição de família com a qual você concorda:
a) Família é nonononononon ( );
b) Família é nonononononon ( );
c) Família é um núcleo somente formado a partir da união entre homem e mulher ( );
d) Família é nonononononon ( );
e) Não tenho opinião formada.
Por último, fiquemos atentos ao fato de que dentro da pergunta proposta na enquete aparece depois da definição de família a seguinte frase: "prevista no projeto que cria o Estatuto da Família". Frase esta que cria adesão do respondente posto que coloca a definição num patamar institucional e por tanto legítimo e mais dificil de contrariar.

domingo, março 09, 2014

A pesquisa “Cinema: o que os cariocas querem ver”



Uma pesquisa feita pela JLeiva Cultura & Esporte com 1.501 habitantes do Rio publicada no site: http://oglobo.globo.com/cultura/riofilme-vai-incentivar-producoes-de-filmes-de-acao-11713581#ixzz2uTiawAj7, chegou às seguintes conclusões: “A produção cinematográfica brasileira vive um evidente contra-senso há pelo menos três anos. Entre janeiro de 2011 e dezembro de 2013, o país assistiu ao lançamento de 294 filmes nacionais. Deles, 119 (40%) eram dramas, e 100 (34%), documentários. Esses dois gêneros não aparecem, no entanto, na lista dos preferidos do grande público”
“(...) Por outro lado, 24% dos moradores do Rio se dizem fãs incontestes de filmes de ação — o gênero mais popular na lista das preferências, seguido de perto pelas comédias, com 22%. Apesar disso, nos últimos três anos, o Brasil teve apenas 11 lançamentos nacionais de ação, ou 4% da produção. Para os diretores da Rio Filme, é hora de mudar (...)”. Estes achados postos, pergunto-me. “é hora de mudar” o que?
Eu acredito na ciência como criadora de alguns modelos explicativos, eu acredito em amostragens bem planejadas. Incomoda-me a forma como foi redigido o artigo pelo (a) jornalista ao falar que o “grande público” opinou tal coisa... Ou que os “moradores do Rio” escolheram tal outra... etc.
Em primeiro lugar, 1.501 pessoas não são nem o “grande público”, nem são os “moradores do Rio”... Tudo bem, tudo bem, não vou brigar com os estatísticos... Suponhamos que a amostragem foi bem desenhada e que ela “representa” os espectadores que consomem filmes brasileiros no Rio de Janeiro. Mesmo assim, quem redigiu o artigo deveria sempre referir-se à “amostra consultada”. Desta forma, não se corre o risco de enviesar a argumentação. É obrigação de aqueles que lançam mão do raciocínio científico lutar pela clareza na hora de expor resultados de pesquisa. Falar neste caso da “amostra consultada” permite ao leitor lembrar sempre das limitações que toda pesquisa por amostra traz no seu DNA. Por tanto, uma informação importante omitida no artigo foi a margem de erro da pesquisa. Isto é, se fosse possível consultar à totalidade do universo dos espectadores cariocas, provavelmente as respostas do universo se afastariam em tal ou qual porcentagem das respostas coletadas.
Fico muito impressionado que seja um francês, Adrien Muselet, diretor comercial da Rio Filme, que defenda que “o financiamento dos filmes está totalmente desconectado do interesse do grande público...” Quem diria. Um francês... E o glorioso cinema francês ao longo da sua história conectou-se assim ao grande público?
Que bom que não o fez. Do contrário a história do cinema mundial não teria conhecido Os Cahiers, nem a Nouvelle Vague. “estamos sempre sós” escreveu Godard em 1958.
O chamado “grande público”, sabemos, é conservador quase que na sua essência. Mesmo os empreendimentos que mais dependem dele para sua sobrevivência como é o caso do mundo da informática, da moda ou da gastronomia, investem a “fundo perdido” em pesquisas cujos resultados não estão imediatamente atrelados ao gosto popular, tudo o contrário. Dão passos dilatados na direção de tudo o que é desconhecido ou não imaginado por esse “grande público”.
No campo das artes, a relação: público / obra adquire formas ainda mais paradoxais.
Basta imaginar um Artaud, Shoemberg, J.L. Borges, Stravinsky, Bergman, Chagal ou Manoel de Barros, tentando conectar-se aos interesses do “grande público”.
Em verdade, e como assinalava U. Eco; Todos nós, em algum momento, fazemos parte de este “grande público”. A questão não é que a obra de arte deva conectar-se com o “grande público” a questão é que esse “grande público” deve ser amparado por um substrato em que as possibilidades de estudar, vivenciar, ter contato com diferentes modos de expressão artística, científica e filosófica sejam um fato normal e corriqueiro. Ao ponto de que aqueles chamados por Victor Hugo os “nervos expostos da sociedade” que são os artistas, revelem e presenteiem à sociedade com seus insights estéticos e éticos. E que, mesmo pertencendo a um grupo de “privilegiados” por viverem dos seus produtos simbólicos, se lhes reconheça e assegure a garantia de uma vida digna, face ao risco espiritual e psíquico que concentra o decoro e a coragem de realizar o que chamava Salvador Dalí “Lo creado”. Essa vida digna nos os brasileiros e estrangeiros que pagamos impostos conseguimos oferecer, por exemplo, aos congressistas, aos tecnocratas do estado (que inventaram, por exemplo, o horário de verão para infernizar nossas vidas), aos cientistas pesquisadores, famílias vulneráveis etc. Por que uma sociedade deveria ser tão obtusa ou estúpida a ponto de negar apoio a produtores de símbolos como são os artistas do cinema? Mesmo que esses símbolos requeiram por parte do público que os recebe maior interpretação, concentração, esforço e coragem estética para desfrutá-los?
Não se lhe exige à matemática, nem à física, nem à geologia, nem menos ainda à mecatrônica que, de forma imediata, se conecte aos interesses do “grande público”.
Lembremos da história do poeta Maiakovski quando numa “turnê” pelo seu país fez um recital de poemas no meio de operários. Na ocasião, lhe foi perguntado por que não fazia poemas mais acessíveis à classe operária? O poeta respondeu que lhe estranhava que essa exigência não se fizesse às ciências, e por tanto, aconselhou aos operários estudarem mais se desejassem entender seus poemas.
O secretário municipal de Cultura do Rio de janeiro, Sérgio Sá Leitão e o diretor comercial da Rio Filme, Adrien Muselet, estão interessados em contribuir para o aumento do market share do cinema brasileiro. Isto não é um pecado. O pecado é estes senhores não estarem também interessados em que o Brasil contribua para o cinema mundial com propostas e descobertas éticas e estéticas. Isto último o cinema francês fez com galhardia e boa parte graças ao apoio do Estado. Sabemos que o caminho íngreme na direção de estas contribuições sempre é paralelo e alternativo ao chamado gosto do “grande público”.
No cinema, assim como em todas as artes, o criador que vai na direção do que o “grande público” espera, estabelece uma comunicação “incestuosa” com seu receptor. Dificilmente “sangue novo” entra nas veias da arte que quer agradar.
Entretanto, para aqueles que estamos acostumados a criar com pouco ou nenhum apoio de quem quer que seja, Salvador Dalí deixou-nos um norte nestas palavras: “A alma do artista fortifica- se com aquilo que a sujeita e desabotoa no meio daquilo que a nega”   

Bons sonos, bons sonhos.


Eladio Oduber sociólogo e músico (sempre a procura de patrocínios)

sábado, fevereiro 18, 2012

Caminhando com Ana Cecília

Ana: papai, o que mais te fascina deste mundo?

Eu: a possibilidade de autonomia. Imaginar que a gente pensa uma coisa e pode realizá-la. E a você?, o que te fascina do mundo?

Ana: viver numa bola cheia de pessoas que caminham e se reproduzem. Uma bola cheia de cafés e lojinhas... Papai olha, uma folha de essa árvore acabou de se aposentar... Fica esperto, o próximo pode ser você.


 PS: Ana, obrigado por me lembrar que os fascínios também são pré-socráticos.


Eladio

Foto: Natalia Oduber

domingo, setembro 11, 2011

11 de setembro

Auschwitz  colocou todas as dúvidas sobre a Razão,

Hiroshima roubou a fé sobre a Ciência,

11 de setembro  mostrou nossa condição de espectadores frente á  tragédia humana.

Eladio

terça-feira, agosto 02, 2011

Gênero e Semiótica

Não consigo esquecer aquela barriga. Digo isso naturalmente, como uma constatação. Já faz tempo que a vi. Não foi uma foto, ou uma imagem na TV. Foi algo que chamou minha atenção numa pessoa que estava viva, “alive”, diante de mim. A barriga dela não tinha a menor importância, no contexto. Mas, chamou minha atenção. Também não foi demais. Na hora, parecia só um detalhe.
De repente percebi que é uma imagem que persiste. A princípio, não tem nada de assustador ou inusitado. Uma barriguinha descuidada de uma menina de 13, 14 anos, só isso. Uma menina de classe média, brasileira. Acho que foi por isso que chamou minha atenção. A blusa bonitinha, meio baby look, feita para realçar o corpo, contrastava com aquela barriguinha descuidada, como eu disse. Uma barriga de mãe de família, de alguém que “não tem tempo para si”, não tem tempo para “se cuidar”. Acho que essa é a mensagem daquela barriguinha: não é exatamente de uma adolescente desse tempo, dessa classe.
Revendo a imagem, lembro também da postura da menina. O corpo escorado em algum móvel. Não sentada, no estrito sentido do termo. Só encostada mesmo, pra descansar de ficar em pé, alerta. Um momento de entrega, de relaxamento, de desatenção; inclusive consigo. Como alguém que se apóia no cabo da vassoura entre duas varridas, aquela menina se apoiava no móvel e também no momento, no intervalo da atenção.
Falando sobre questões de gênero, a cientista social Tatau Godinho contou que, no estado de São Paulo, as meninas não participaram de atividades de férias oferecidas nas escolas públicas. A análise do baixo comparecimento das meninas revelou que a maioria das atividades propostas eram mais atraentes para os meninos. Mas, o motivo principal foi a incumbência que tinham de cuidar dos irmãos menores. Na mesma ocasião, Tatau expôs os resultados de pesquisa sobre o uso do tempo de homens e mulheres. O uso do tempo de lazer mostra que a primeira atividade considerada de lazer pelas mulheres adultas é encontrar os familiares. Em segundo lugar estão as práticas religiosas e, por último, assistir televisão.
As duas primeiras atividades de lazer são relacionais. A última é menos lazer e mais descanso do corpo, “jogado no sofá”, como diz a dona de casa Abigail. Aliás, esse é um sonho dela: passar o dia deitada, assistindo televisão. Mas, por enquanto, vai assistindo e fazendo outras tarefas domésticas: passa roupa, lava louça...
Visitar parentes é reforçar redes e, ainda cuidar: das pessoas diretamente e das relações que permitem deixar as crianças com alguém, por exemplo. A religião pode representar a mesma coisa. As mulheres parecem considerar lazer ações que permitem a realização das tarefas cotidianas, dos deveres. Estar com parentes e ir a igreja podem não ser exatamente escolhas... A pergunta é: quando é que essas mulheres podem fazer algo para si mesmas?
Quando é que essas mulheres, enredadas nos fios da vida privada, podem tratar de assuntos públicos?
O que observamos é que para que uma mulher saia de casa, ela ainda precisa deixar outra em seu lugar: a mãe, a sogra, a tia, a filha, a empregada doméstica ela própria tendo deixado alguém em seu lugar. Se é assim, o lugar da mulher no mercado de trabalho não é da mulher, não está adaptado a ela. É fácil concordar com isso.
Mas, se para sair de casa a mulher precisa deixar outra como refém, não é só o espaço público que está projetado para o homem. O espaço privado também é concebido – e gerido – a partir de uma lógica masculina. A mulher pode ser a “rainha do lar”, sua casa é o seu reino. Mas a lógica desse reino não existe em seu benefício, ela está voltada para um mundo ainda organizado a partir da ótica masculina. Num reino parlamentarista, ser rainha não é governar. A rainha não tem um poder real, com e sem trocadilhos. É o que parece acontecer com a rainha do lar.
Aquela menina que eu vi, com a barriguinha de uma senhora mais velha, já vivida é, portanto, princesa, herdeira e refém do reino de sua mãe. Ela tem a obrigação de cuidar de outros e, seu corpo demonstra, para isso é necessário esquecer-se de si.

segunda-feira, fevereiro 21, 2011

Vivendo num mundo super-equipado

Foi-se o tempo em que o vento nos mares determinava o rumo da navegação. Assim como faz tempo que a demora das viagens não depende mais do humor dos cavalos. Se alguma coisa pode-se dizer sobre a diferença entre nós e os “antigos” mais próximos e a constante e paulatina ilusão de controle sobre os chamados “imponderáveis da vida cotidiana”.
Dentre eles, os surpreendentes viesses da alma humana.
Arlie Hochschild mostrou nas suas pesquisas o processo de treinamento dos sorrisos das comissárias de bordo da Delta Airlines descrevendo, além do esforço físico, o “esforço emocional” exigido pela empresa. As funcionárias chegaram a confessar em entrevistas que o sorriso “estava nelas, mas não era delas”. A empresa tinha lhes roubado a "alma".

Outro paralelo pode ser feito com os objetos que compramos diariamente. Os motivos das nossas escolhas são muitas vezes orientados por fatores que desconhecemos completamente.Quem sabe se analisarmos a "alma" destes objetos descubramos alguma coisa?. São estes aspectos "imponderáveis" da alma dos objetos que o chamado "mercado" controla primorosamente.
            Basta olhar com atenção o desenho de algumas mercadorias de consumo cotidiano para perceber que há tempos impõe-se uma estética do “sobre-dimensionamento” nestes objetos.
            Compramos, por exemplo, sapatos feitos e desenhados para quem vai escalar montanhas ou caminhar em trilhas íngremes. As cidades no Brasil e outras partes do planeta estão cheias de automóveis preparados para o rally Paris-Dakar. Muitas das nossas roupas poderiam ser usadas em filmes de Indiana Jones e assim por diante.
            Esta percepção sobre a hiper-dimensão de aspectos simbólicos no capitalismo já tinha sido apontada por Theodor Adorno quando analisava o uso de uma estrutura complexa como é uma orquestra sinfônica para a gravação de um tema de três minutos num comercial de sabonete.
            A sobre-dimensão de elementos “intangíveis” no mundo atual chegou ao nível das representações. Principalmente nas representações cartográficas das cidades.
            Isto devemos à internet. O Google Earth, por exemplo, nos oferece escalas das cidades que coloca o internauta na situação virtual de dominação espacial e geográfica de um piloto de guerra. Existe até um recurso por meio de atalhos no teclado em que o usuário passeia-se pelos céus de qualquer cidade num Caça F16 que é um avião de bombardeios.
            Os detalhes das fotografias feitas pelos satélites disponibilizam detalhes que são para a maioria dos internautas-espectadores desnecessários para as demandas do dia a dia.
            Vemos como no âmbito das representações estamos servidos de um hiper-realismo que, em verdade, não necessitamos. 


Assim como acontece com os celulares com GPS, relógios com manómetros analõgicos, automóveis, tênis, roupas e canivetes multiuso aparelhados de lanternas e bússolas.
            

Quanto poder ilusório queremos consumir?

Quanto poder “real” estamos transferindo para nossos Big-Fathers?

O tempo nos mostrará um dia o tamanho e a dimensão da ignorância construída a milhões de mãos.

Abraços do Eladio

Conferir: Howard Becker no livro Falando da Sociedade. Anthony Giddens no livro Sociologia, Theodor Adorno em algum parágrafo da coleção “Os Pensadores” que agora tenho preguiça de olhar. E, principalmente, é útil conversar com meu amigo Fernando Campos Leza para aprender um pouco sobre divagações e delírios em recursos informáticos.


Imagem: Catedral submersa. Eladio Oduber / Lápis grafitti sobre papel comum

sexta-feira, fevereiro 11, 2011

Brad Mehldau

Queridos amigos e amigas:



No endereço abaixo está uma música que me emociona muito. Quando queiram, desfrutem-la:


http://listen.grooveshark.com/s/Blackbird/2nyho7?utm_campaign=grooveshark-app&utm_medium=email&utm_source=share&utm_content=call-to-action

domingo, janeiro 30, 2011

Bóveda

Roble: por que o céu estrelado é tão bonito?

Jean Guilherme: por que é nele onde repousam as utopias, ilusões e promessas de amor não realizadas.

Eladio 

Desenho : "Coizinhas" Ana Cecília

segunda-feira, dezembro 27, 2010

Encontros com Jean Guillerme


Roble: você tem amigos? 


J G: sim, alguns que não são homofôbicos, homofônicos, racistas, machistas ou sem compaixão; 


Roble: qual é tua religião? 


J G: A minha é a do “Narguilê”. Quando o totem não está acesso significa que não estou cuidando do tempo entre amigos, amores, companhias adoráveis que sempre são maiores e melhores que aquelas que eu mereço. Contrária a outras religiões que são um investimento futuro para além da morte. A minha me leva à morte, agora, como uma noiva tomado pelo braço até o mármore abismal; 


Roble: por acaso te comparas aos outros?


J G: Comparo-me sim aos outros, tento faze-lo sem hipocrisia. Desejo dançar diariamente, durante horas, virar ave luminosa. Ir para os pontos de ônibus, e os shoppings centers e ver como a humanidade é tosca, pesada, hipopótamos com carapaças de tartarugas. Soltar a corda, e no dia seguinte, novamente, ser um deles. Começar tudo de novo. Não tem final feliz. 


Roble: já escrevestes um diário? 


J G: já escrevi um semanário, um anuário, tento falar das idéias e não das pessoas a minha subjetividade cansa aos outros, dou um tempo de me mesmo, recolho as velas da minha auto-estima, enfio um alfinete no frágil zepelim dos meus desejos. 


Roble: por acaso  escutas música? 


J G: Se possível, não final da vida, farei toda minha música assim como hoje faço meu pão... Não me iludo, durante dias compro pão da dona Michico da quitanda. A música feita em casa, assim como o pão, requerem vida ritualística, menos apetite pelo poderzinho do dia a dia. 


Roble: fazes exercícios físicos? 


J G: sim, e quando os faço  escuto Brad Mehldau e penso em M.C. Escher e vejo quanta obtusidade há no que estou fazendo.


Roble: por acaso defines planos? 


J G: defino paralelepípedos, bolhas de sabão, círculos empoeirados de estrelas; 


Roble: eres gentil? 


J G: sempre, com todos e todas, com as pedras inclusive. E também com aquele que está muito perto de mim há muitos anos... Eu mesmo; 


Roble: você trabalha com o que gosta? 


J G Isso significa o que? Ganhar dinheiro com a minha paixão? Eu penso em procurar um mecenas, se não achar, procurarei um bom patrão, se não,  procurarei o melhor patrão, “O Estado”. Quero dizer... passarei em um concurso público. A estas alturas... Será que vou gostar do trabalho? Se não, então não obrigarei a minha paixão a me dar dinheiro... As árvores de Romã são tão líricas que seria um desastre vê-las dando ovos... 


Roble: perdoas? 


J G: não, não sempre... Nietzsche ensinou-me que é melhor uma pequena vingança assim ficamos protegidos de nos sentirmos melhores do que o inimigo. 


Roble: eres otimista? 


J G: cultivo uma dose de  fatalismo que me permite libar o senso dramático dos meus dias. O otimismo, nos termos hoje colocados, é o mais oco e superficial dos pontos de vista. É lamentável dividir o mundo em otimistas e pessimistas. Prefiro curvar-me todos os dias à Deusa da Fortuna e confessar-lhe que quando seu leme atinja minha humanidade não esqueço que bebi e comi muito da sua Cornucópia. 


Roble: procuras ajuda? 


J G: sim, no coração dos meus amigos que não são homofôbicos, homofônicos, machistas e sem compaixão...

Fecha-se o ciclo.

Quanta felicidade te desejo caro (a) leitor (a) anônimo (a) de Mountain View, Califórnia.

Eladio Oduber

PS2: Obrigado Ana e Cinthia, obrigado Cecília Oliveira por me influenciar e ajudar a organizar estas idéias naquele almoço chinês de domingo...