Os desejos incestuosos dos diretores de cinema
Orestes, filho de Agamenon e Clitemnestra, intera-se, na
vida adulta, que seu pai foi assassinado num complot que a sua mãe e seu tio
Egisto realizaram quando ele apenas era uma criança[1].
Quando Orestes atinge a maioridade vinga a morte do seu pai matando a
Clitemnestra. Orestes fica então louco. Robinson Jeffers[2]
cria em 1925 uma versão do monólogo do Orestes quando volta para Micenas depois
de ter vagado pela floresta, “torturado de visões”. Estas palavras ele profere
em resposta a Electra, sua irmã, que na ocasião propõe-lhe casamento:
Tive uma visão, nós nos movíamos nas
sombras;
Tudo o que fizemos e sonhamos
Era recíproco; o homem perseguia a
mulher,
a mulher agarrava-se ao homem; reis e
guerreiros
combatiam-se na escuridão, todos
amavam
ou lutavam interiormente, cada qual
perdido,
buscava os olhos de alguém que o
louva-se,
nunca os seus, sempre os alheios.
Voltando-se, viam apenas um homem de
pé no começo, ou
Olhando para diante, outro no fim; ou
para cima,
Homes no céu brilhante, correndo e banqueteando-se.
A estes chamam deuses...
E, no íntimo, mil desejos
incestuosos...
(Robinson Jeffers apud MAY:1991 p. 109)
A história do Orestes como um ponto de partida nos
permite imaginar que o olhar do diretor de um filme pode ser amplificado por
dois dispositivos: O primeiro, a câmera, que transcende sua subjetividade, que
tem “sede de realidade”, sede histérica de “verdades” e “ficções”. E o segundo.
A tela; com “mil desejos incestuosos”, “procurando os olhos de alguém”. Nunca os seus,
sempre os alheios. A tela é também o grande olho do diretor e não somente a
câmera como normalmente se pensa. Entretanto, na projeção sobre a tela o olho
do diretor está sempre à procura de outros olhos que deseja encontrar? Nem
sempre.
No cinema, assim como em outras
artes, o criador que toma a direção do que o “grande público” espera,
estabelece uma comunicação “incestuosa” com seu receptor. Dificilmente “sangue
e genes novos” entram nas veias da arte que é feita para agradar.
Entretanto,
o grande olho da tela que se inclina na direção de outras subjetividades, que
se apaixona “voltado para fora” isto é, o cinema que não é feito para a
diversão do grande público, entende dolorosamente, como já dizia André Breton,
que “o principal inimigo da arte é a vida”. Compreende que os membros do
próprio clã hostilizam a criação por que temem a peregrinação do “amor” voltado
para longe dos muros da aldeia. Robert Stam no seu livro “Introdução à
teoria do cinema” lembra as palavras que em 1958 foram ditas pelo Godard: “estamos sempre sós”. Esta
frase resume o preço pago pelo diretor cuja tela procura seus próprios olhos e não os
alheios.
O cinema,
afastado da relação “incestuosa” com seu público ganha profundidade
estilística. Ausência ou presença de estilo diferencia um filme de
outro. Entretanto, “estilo” não é uma categoria metafísica. Estilo significa síntese
e mudança ao mesmo tempo. Sem estes dois elementos qualquer cinematografia ou
qualquer arte torna-se ingênua... Ou melhor, torna-se inerte. E qual é o preço
das mudanças estilísticas? Qual o preço de superar a imobilidade de estilo?
Muito
provavelmente a solidão. Ou ficar com tão pequeno contingente de público que a
produção não convença seus potenciais patrocinadores.
Então esconderá alguma
verdade aquele pensamento - que faz parte do senso comum cinematográfico - de
que o filme “vai ao encontro do seu público”?
Pensemos
sobre profundidade estilística, ou sobre diretores, ou sobre filmes que decidem
caminhar afastados do público.
O espectador. Aquele
elemento imponderável que enche ou se ausenta das salas por motivos “quase”
inexplicáveis e que provavelmente se identifica com o que está sendo projetado
por que quer entender quem ele é antes de morrer, a semelhança do soldado
agonizante no quadro do Filoxeno[3].
PS: Dedico este post aos meus admirados alunos de métodos no curso de cinema IESB- Brasília: Alanna Pinheiro Amorim, Sandro Villanova, Cássio Oliveira, Pezão, Teninson... eles ajudaram a objetivar estes pensamentos . Obrigado menina obrigado meninos.
[1]História de conflito humano escrita por Esquilo na Grécia antiga.
PS: Dedico este post aos meus admirados alunos de métodos no curso de cinema IESB- Brasília: Alanna Pinheiro Amorim, Sandro Villanova, Cássio Oliveira, Pezão, Teninson... eles ajudaram a objetivar estes pensamentos . Obrigado menina obrigado meninos.
[1]História de conflito humano escrita por Esquilo na Grécia antiga.
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