Sobre pesquisa e outras infâmias

Diário de campo de dois espectadores e um pródigo bucaneiro.

terça-feira, abril 29, 2008

Schopenhauer e os bonsais

Os bonsais me fazem sofrer. Não gosto de achar belas aquelas árvores atrofiadas, treinadas para se tornar miniaturas. Sofro também porque imagino que aquela plantinha acredite mesmo ser uma árvore. Talvez se sinta feliz, protegida de todos os perigos quando tinha – em potência – como diria Aristóteles, a capacidade de sobreviver às tempestades. Contenta-se com a água medida, contada a gotas, apenas suficiente para sobreviver, quando poderia receber por todo o corpo as ráfagas da abundância das chuvas de verão. Não gosto de pensar que aquela plantinha possa se sentir abalada por um sopro de vida quando uma árvore pode lutar contra a força dos ventos, e vencer, reafirmando suas raízes.

Ai, as raízes podadas do bonsai. São como os pezinhos atrofiados das mulheres orientais de antigamente: garantia de sua contenção. Acho que é isso, os bonsais são como as mulheres de Schopenhauer: miniaturas forjadas de ser humano. Elas não têm vontade, apenas desejam, têm caprichos; são voluntariosas. São como crianças porque o seu querer não interfere no mundo. É só o bater malcriado de um pezinho calçado em sapatinho de verniz. Sua vontade tem as asas aparadas dos pássaros criados fora da gaiola, pretensamente livres para voar.

Conheço mulheres assim. Elas também me fazem sofrer. Mantidas numa sala de espelhos, elas acreditam ser apenas a imagem de si que vêem refletida. Não entendem que os espelhos as limitam às dimensões – e profundidade – de um vaso cerâmico de bonsai.

Para Brigitte Bardot, que não se deixou conter pelos contornos de sua imagem.

Para Aristóteles, “Todas as coisas são em potência e ato. Uma coisa em potência é uma coisa que tende a ser outra, como uma semente (uma árvore em potência). Uma coisa em ato é algo que já está realizado, como uma árvore (uma semente em ato)”.

O exemplo arbóreo está na Wikipedia http://pt.wikipedia.org/wiki/Arist%C3%B3teles

Ver Metafísica do Amor Sexual de Schopenhauer e A arte de lidar com as mulheres, coletânea das opiniões do filósofo sobre as mulheres, feita por Franco Volpi.

Cinthia Oliveira

Imagem: Bonsai / E. Oduber / abril 2008

sábado, abril 12, 2008

Sabedoria Palafrenera

Quatro negros cavalos puxam a carruagem da alma: o raciocínio, as convicções, os hábitos e as paixões.

Por razões que não consigo imaginar somos regularmente conduzidos com mais força e sentido por algum deles. Às vezes, dependendo da idade ou da época da nossa vida, permitimos, durante algum tempo, que um ou outro tome a frente.

É possível que as ancas de aquele animal treinado fiquem tão fortes que nunca mais possamos deté-lo. E com isso percorramos trilhas de glórias e misérias que nos fazem adquirir o que se chama de “estilo pessoal”.

Triunfos e realizações tangíveis sempre foram as terras a onde se dirige sozinho o cavalo do raciocínio e nesse percurso também encontra a morte pela faca da frieza egoísta da alma...

Quem dá rédeas ao cavalo das convicções prova do orgulho e nobreza dos heroísmos e pode, quem sabe, sucumbir à morte da solidão ou à pobreza material das escolhas extremas...

Quando o cavalo do hábito é quem governa, a alma é levada a terras pacíficas e conhecidas. E, muitas vezes, é inevitável o encontro com o tédio e fastio mortais ao longo do caminho tradicional e rotineiro...

Por último, o cavalo das paixões nos arrasta até a fruição dionisíaca de uma vida exuberante e criativa e, da mesma forma, pode suicidar-se prematuramente no poço dos afetos...

Querido leitor peço ajuda!

E se, ao mesmo tempo, dermos rédeas a dois ou três cavalos?

A quais dois?

A quais três?

A que terras iremos parar?

E se azoitamos os quatro para todas as direções?

E se nenhum puxa?

Acho melhor perder toda esperança. Jamais os quatro negros cavalos correrão na mesma direção...

Sabedoria “condottiere” nos ampare...

Sabedoria palafrenera nos acompanhe...

Abraços do Eladio

Imagem: Cabeça de Rei / Eladio Oduber / Acrílico, guache e crayon sobre papel / Abril de 2008. (inspirado numa escultura de cavalo grego)