Sobre pesquisa e outras infâmias

Diário de campo de dois espectadores e um pródigo bucaneiro.

domingo, dezembro 04, 2005

Não me tires sem razão, não me guardes sem honra...

“Eu rio , e minha risada não está dentro. Eu ardo, e meu ardor não é visto de fora”
N. Maquiavel

Há profissões que parecem cultivar dentro de si a semente da sua própria destruição. É o caso da docência.

O professor em alguns momentos torna-se um profissional condenado à desaparição, sobretudo porque ele se esforça para alcançar baixos níveis de indicialidade.


A indicialidade é um conjunto de acordos latentes ou não declarados que os atores em sociedade constróem para poder viver em paz.
Por exemplo: se um aluno me encontra num dia com meus níveis de indicialidade baixos e me cumprimenta... Oi professor, tudo bem? Eu posso responder mais ou menos assim: você está me questionando sobre as circunstâncias da esfera pública ou da esfera privada? em qualquer caso estas arriscando-te a ser importunado por mim ou por qualquer um...

Creio que os revolucionários franceses herdaram dos exércitos da antigüidade o costume de inscrever nas suas espadas a frase “Não me tires sem razão, não me guardes sem honra”. O contraponto brasileiro ou português para esta frase é “a palavra é de prata o silêncio é de ouro”. Nesses dias de baixa indicialidade talvez seja melhor ficar com a primeira opção da primeira frase e com a segunda opção da segunda.

A atitude de momentânea intolerância aos lugares comuns da nossa cultura carrega nossas cabeças de humores e nos torna ameaçadoras palmatórias do mundo.
Entretanto, preferimos ser bígamos a divorciarmos do ofício, e aplicamos nossa repressão didática com força nestas épocas em que a precariedade de símbolos é dominante.

Tenhamos calma; quando há muitos hereges é por que a inquisição está perto do fim...
Na antigüidade as coisas não eram menos estranhas ou menos divertidas. Dizem que Sócrates seduzia belos jovens nos ginásios. Posteriormente, nas universidades européias do século XIII a ginástica foi proibida. Em Oxford os alunos transgressores eram açoitados. As aulas começavam as 06:00 da manhã e se prolongavam até as cinco da tarde. Por isto mesmo, os alunos viviam nas tabernas. Deus me livre... Prefiro todavia minha terra generosa, Macunaíma, e antropofágica. Deixemos que eles guerreiem entre si, que recolham e enterrem seus mortos e que “a terra lhes seja leve”.

Dias de glória virão, o futuro nunca morre totalmente. As nossas idéias não se transformam elas se decompõem. Nosso amor pela alegria é uma apoteose. Vamos avivar o fogo do nosso ofício com dança e gargalhadas. Coitados daqueles que enchem a boca para dizer; colega “o lúdico também tem seu espaço”

Abraços aos colegas professores neste sábado de dezembro chuvoso.

Eladio e Cinthia

Conferir:
MANCHESTER, W. Fogo sobre a terra: a mentalidade medieval e o renascimento. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

Imagem:
Alosete - Espada (acuarela - España)

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

visito o blog sempre. e desta vez, não vou calar, Eladio: está a cada vez, melhor. textos precisos e que nos impelem a um exercício antiguinho, pouco usado nos dias atuais, com sobriedade: a reflexão. para quem teve o prazer de fazer parte de seu seleto grupo de alunos, eu me sinto alguém cuja espada nunca será tirada sem razão, nem tampouco guardada sem nenhuma honra. acredito e muito no trabalho sedutor de alguns mestres da educação. homens e mulheres que ao entrar em sala de aula, de frente para as mais variadas cabeças, sentem-se de novo, em uma cruzada. é começar sempre. me lembro de algumas vezes, vc entrando em sala meio calado, quase casmurro. mas bastava que um dos seus pupilos levantasse os olhos e demonstrasse interesse, paixão, pensamento coerente, e a nuvem desaparecia de seu rosto. foi assim que muito mais que Sociologia, vc me incutiu o gosto renovado de que nada sabemos direito. por isto talvez, façamos quase tudo tão errado. meu beijo a vc e à Cinthia por este espaço glamuroso, aonde a gente pode espreitar pensamentos e decidir o que viver a seguir...sempre, tua aluna e fã, Valéria Freitas. Brasília, DF.

9:10 AM  
Anonymous Anônimo said...

terráquios! marítimos! aéreos!
suspirou. último sopro. pálpebras cerradas! inerte! prestes a feder!
se foi! 5... 4... 3... 2... 1...
autodestruiu. um alien em sua barriga. verme inquieto. combustão espontânea.
o pirata morreu!
dias de (...) virão, o futuro?
amor! alegria! apoteose! fogo! dança! gargalhadas!
eu! parasita interestelar!
da estação espacial liber do hipercosmo.
comi deliciosas vísceras!
sal. gordura. açucar.
hum...
nhame, nhame, nhame!
lá eu estava. à presteita.
fui digerido.
pobre pirata. digeri.
eladio e cinthia, como um oitavo passageiro, lá estarei. em suas barrigas:"não me tires sem razão, não me guardes sem honra"...

8:47 PM  

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