Todos os porcos podem voar !
Por quem ou porquê você estaria disposto a dar a vida?
É uma pergunta que gosto de fazer aos meus alunos no início do semestre na tentativa de descobrir algumas “finalidades” das novas gerações. Nesta minha pesquisa, de uma só pergunta, que faço a dez anos, não tenho encontrado surpresas. A esmagadora maioria dos alunos respondem que dariam a vida pelos seus familiares diretos; pai, mãe, filhos, etc.
Se pudéssemos fazer esta pergunta a alguns venezuelanos do século XIX, muitos responderiam que dariam a vida pela pátria. Muitos dos participantes do Movimento dos Sem Terra já deram a vida pela causa da terra. Indígenas no mundo inteiro o fizeram e fariam pela mesma razão. Este fato nos remete a um antigo conceito filosófico; a teleologia ou estudo das finalidades últimas.
Salvo engano, foi Aristóteles quem primeiro desenvolveu uma teoria sistemática sobre as finalidades últimas das coisas do mundo. Na teoria aristotélica o conhecimento deveria focar-se nas causas. Entre as causas formuladas estavam as causas finais. A explicação do porque as pedras rolariam ladeira abaixo seria a inclinação ou tendência destas a procurar o nível mais baixo. Este era, para Aristóteles, o thelos das pedras, algo assim como uma missão inata, seu fim último.
Hoje, um sorriso nos lábios aparece em quem escuta a explicação aristotélica do rolar das pedras. Esta versão não combina com nossos atuais cânones da racionalidade científica. Com o deslocamento histórico do ritualismo e a poésia para territórios mais positivistas, as finalidades somente podem ser atribuídas a seres humanos. Pedras não têm finalidades. Entretanto, foi na biologia onde a perspectiva teleológica floresceu, mesmo dentro da modernidade. Camaleões mudam de cor porque têm “fins” de defesa, ursos e cachorros fazem xixi nas árvores porque precisam demarcar territórios. Estas conclusões da zoologia e da biologia são aceitas sem que nenhum de nós conheça a existência de uma conversação ou entrevista com camaleões ou ursos, para confirmar se eles mudam de cor ou fazem xixi pelas razões atribuídas.
A vocação nos seres humanos é uma forma de thelos a “dedicação incondicional a uma tarefa” define a atitude de indivíduos com “causa”. Max Weber refletiu sobre este assunto talvez inspirado em Aristóteles.
A vocação científica, é um “mandato interno” que orienta à ciência valorizado na nossa cultura. Mesmo que saibamos que estatisticamente muitos indivíduos vocacionados para a ciência sucumbem pela falta de patrocínio ou pela falta de vocação para procurá-lo.
Quase no final da aula um aluno perguntou-me, professor, e então qual é seu thelos particular. Eu respondi; no início da minha vida consciente pensei que minha missão neste mundo era brincar com os sons, fazer música. Depois na idade adulta cheguei à conclusão que minha finalidade última, nesta vida, era fazer pesquisa, produzir conhecimento. Hoje sei que meu thelos, é estar casado, ser marido, amar a minha mulher... descobri isto nos momentos de solidão amorosa. Quando estou sem amor não consigo nem fazer música, nem pesquisar. Algumas alunas da sala suspiraram e chegaram a comentar: "professor, você bem que poderia ensinar esta teleologia para os homens desta cidade”, foi então quando um aluno bem atento levantou o braço e falou; “calma professor não jogue seu thelos pr’a cima do thelos dos outros...tô fora!!!”
abraços do Eladio e Cinthia
PS: O título deste texto nada tem a ver com seu conteúdo. Foi tudo jogada de marketing. Espero tenha dado certo.
Este texto vai com especial carinho a dois admirados colegas, os sociólogos: Roniere Ribeiro do Amaral (Roni) e Thadeu de Jesus Silva Filho – consultores da Europa anglo-saxónica e da América setentrional respectivamente.
PS 2: Num comentário posterior, meu amigo Bruno Ayres me convenceu que o título tem muita relação com o texto. Quem é que vai saber qual é o thelos dos porcos? derrepente é voar mesmo. Obrigado Bruno, valeu.
PS3 A foto do "Pig in the air" foi um achado do amigo Bruno Jorge, obrigado Brunão...
Conferir: RUSSELL, Bertrand. História do pensamento ocidental. Rio de janeiro; Ediouro, 2002.
É uma pergunta que gosto de fazer aos meus alunos no início do semestre na tentativa de descobrir algumas “finalidades” das novas gerações. Nesta minha pesquisa, de uma só pergunta, que faço a dez anos, não tenho encontrado surpresas. A esmagadora maioria dos alunos respondem que dariam a vida pelos seus familiares diretos; pai, mãe, filhos, etc.
Se pudéssemos fazer esta pergunta a alguns venezuelanos do século XIX, muitos responderiam que dariam a vida pela pátria. Muitos dos participantes do Movimento dos Sem Terra já deram a vida pela causa da terra. Indígenas no mundo inteiro o fizeram e fariam pela mesma razão. Este fato nos remete a um antigo conceito filosófico; a teleologia ou estudo das finalidades últimas.
Salvo engano, foi Aristóteles quem primeiro desenvolveu uma teoria sistemática sobre as finalidades últimas das coisas do mundo. Na teoria aristotélica o conhecimento deveria focar-se nas causas. Entre as causas formuladas estavam as causas finais. A explicação do porque as pedras rolariam ladeira abaixo seria a inclinação ou tendência destas a procurar o nível mais baixo. Este era, para Aristóteles, o thelos das pedras, algo assim como uma missão inata, seu fim último.
Hoje, um sorriso nos lábios aparece em quem escuta a explicação aristotélica do rolar das pedras. Esta versão não combina com nossos atuais cânones da racionalidade científica. Com o deslocamento histórico do ritualismo e a poésia para territórios mais positivistas, as finalidades somente podem ser atribuídas a seres humanos. Pedras não têm finalidades. Entretanto, foi na biologia onde a perspectiva teleológica floresceu, mesmo dentro da modernidade. Camaleões mudam de cor porque têm “fins” de defesa, ursos e cachorros fazem xixi nas árvores porque precisam demarcar territórios. Estas conclusões da zoologia e da biologia são aceitas sem que nenhum de nós conheça a existência de uma conversação ou entrevista com camaleões ou ursos, para confirmar se eles mudam de cor ou fazem xixi pelas razões atribuídas.
A vocação nos seres humanos é uma forma de thelos a “dedicação incondicional a uma tarefa” define a atitude de indivíduos com “causa”. Max Weber refletiu sobre este assunto talvez inspirado em Aristóteles.
A vocação científica, é um “mandato interno” que orienta à ciência valorizado na nossa cultura. Mesmo que saibamos que estatisticamente muitos indivíduos vocacionados para a ciência sucumbem pela falta de patrocínio ou pela falta de vocação para procurá-lo.
Quase no final da aula um aluno perguntou-me, professor, e então qual é seu thelos particular. Eu respondi; no início da minha vida consciente pensei que minha missão neste mundo era brincar com os sons, fazer música. Depois na idade adulta cheguei à conclusão que minha finalidade última, nesta vida, era fazer pesquisa, produzir conhecimento. Hoje sei que meu thelos, é estar casado, ser marido, amar a minha mulher... descobri isto nos momentos de solidão amorosa. Quando estou sem amor não consigo nem fazer música, nem pesquisar. Algumas alunas da sala suspiraram e chegaram a comentar: "professor, você bem que poderia ensinar esta teleologia para os homens desta cidade”, foi então quando um aluno bem atento levantou o braço e falou; “calma professor não jogue seu thelos pr’a cima do thelos dos outros...tô fora!!!”
abraços do Eladio e Cinthia
PS: O título deste texto nada tem a ver com seu conteúdo. Foi tudo jogada de marketing. Espero tenha dado certo.
Este texto vai com especial carinho a dois admirados colegas, os sociólogos: Roniere Ribeiro do Amaral (Roni) e Thadeu de Jesus Silva Filho – consultores da Europa anglo-saxónica e da América setentrional respectivamente.
PS 2: Num comentário posterior, meu amigo Bruno Ayres me convenceu que o título tem muita relação com o texto. Quem é que vai saber qual é o thelos dos porcos? derrepente é voar mesmo. Obrigado Bruno, valeu.
PS3 A foto do "Pig in the air" foi um achado do amigo Bruno Jorge, obrigado Brunão...
Conferir: RUSSELL, Bertrand. História do pensamento ocidental. Rio de janeiro; Ediouro, 2002.
5 Comments:
Oi Eladio e Cinthia!!
Que bom vê-los por aqui!!
Apesar do título ter sido marketeiro, acho que afinal ele tem tudo a ver com o meu telos: voar como um porco. Se eles podem, porque eu não poedria??
Bjs e abs,
Bruno
Eládio,
Li alguns textos e, nesse tumulto meu de pesquisadora, senti um alívio bem grande, uma alegria que alimenta o caminhar.
Sobre o thelos: acho que vou morrer sem saber o motivo. Já sobre os morcegos: tenho uma paixão por sua sensibilidade cega e ágil. Interessante só podem se orientar pelas repercussão do som que emitem. Nunca foi tão eficiente "falar para as paredes"!
Tenho achado muito interessante apresentar a pesquisa (?) nos Seminários de Pesquisa em Andamento: sempre se obtém alguma resposta, mesmo que seja o eco.´É por aí que estou me orientando.
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
finalidades últimas... longe de chegar ao nível, pelo menos, de partida, são paredes de um pequeno porão. espaço absolutamente finito. se fecha perfeitamente. miniatura da sociedade - extraordinária preocupação de ordem e de moral. se me perguntas, disposição a dar minha vida? ontem incendiei meu navio. carreguei comigo apenas tecnologia - para futuras magias negras -, armas, drogas exóticas e água. até que eu o amava. eis o motivo do incêndio! quanto eu amava meu navio... mas daqui observo orgulhoso e inútil. este meu naufrágio adquiriu o thelos de porcos: liberdade, anti-sociedade, abertura e partida. Porcos! Não seria esse o seu espírito!?
Ai Eladio! Admirável thelos... pensando na pessia teoria da piramide de Maslow surgiria a pergunta: e aquelas pessoas sem telhas...tem tempo e recursos para descobrir/viver seu thelos? ingenuidades de maslowniadas, maslonixistas ou sei la. Enfim, fica um abraço.
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