A propósito da feiúra
Um texto, da mesma forma que um quadro ou uma imagem, manipula a visão, mexendo propositalmente o nosso foco.
Qual é o diálogo que propõem estes textos? O agir estético de alguns autores parece reverberar dentro de uma linguagem compartilhada. No Brasil a piada que venera o sexo vai acompanhada da humilhação do inimigo ideológico ou de classe.
Há escritores que escrevem para iletrados. Pessoas que somente entendem a vida através de informações velozes e sem transcendência. (sou um deles em vários momentos do dia).
Todos os elementos, nestes escritos, são totalmente esperados. Digamos assim, são estabelecidas afinidades eletivas infracotidianas. A imagem de uma “madame” puxando um cachorrinho de raça, por exemplo.
Que sensação e quais significados transmitem estes escritos? É indizível. Talvez fique a impressão de certa irresponsabilidade. Ocupar o espaço público com opiniões que pertencem ao âmbito da vida privada.
A liberdade de expressão pode ser interpretada dessa forma: falar abertamente das taras pessoais por um canal de comunicação disponível.
É isto que eu chamo de feiúra. Surpreender o leitor com uma ponte de intimidade que ele não pediu. É muito mais belo ficar no nível das “categorias de alta inferência” como a psicologia não gosta.
Meu Deus, para que operacionalizar tanto a alma? Tudo bem, o escritor forçou a barra, procurou uma intimidade desconfortável, espalhou sua feiúra, e agora, nós leitores temos que limpar a rua, arrumar o caos, passar vassoura.
O que ofende nesses autores é a falta de representações. Fico me perguntando; qual é a finalidade de um escritor didicar-se a retratar características singulares reconhecidas? Isto deveria ser proibido!
É exatamente igual que jogar uma lata de cerveja pela janela do carro. Assim, deveriam também ser proibidas as fotos dos passaportes.
Nestes escritores tinta branca sugere luz, tinta escura sugere sombra, e assim por diante... Qual templo irá suportar tal quantidade de convenções? Um banheiro público, talvez.
Quando embarco num desses textos me pergunto, assim como num pesadelo, Onde estou? Que lugar é este? Por que estou contemplando o vazio desta paisagem?
Logo, à semelhança das cigarras, deixo que minha carcaça me suplante e continue observando a feiúra na sua infinita trivialidade.
Abraços do Eladio.
Conferir: MANGUEL, Alberto. Lendo imagens. São Paulo, Companhia das Letras, 2001.
Imagem: General. Eladio Oduber. Nov. 2007
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